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Sísifo e a Vida Moderna

Sísifo e a Vida Moderna

19/11/2021

Venho percebendo em alguns atendimentos uma certa dificuldade das pessoas em conseguirem sair dos padrões tão comuns. Alguns chamam de zona de conforto, mesmo que essa seja totalmente disfuncional e não colabore para nossa qualidade de vida. Na terapia, temos sempre o convite de refletir sobre a vida, nossas escolhas e a estarmos cada vez mais conscientes do que acontece conosco. Então mesmo que um padrão seja percebido, será que isso é suficiente para mudá-lo? Certamente não. Temos muita dificuldade em sair deste lugar conhecido e habitual. A mudança é algo muito difícil. E é exatamente por isso que não posso deixar de associar essas circunstâncias ao mito de Sísifo.

O que conta este mito? Algumas são suas variações. Sísifo era um homem, não um deus. Mas não era “qualquer homem”. Possuía uma inteligência notável. Era um camponês e como tal, percebeu que seu rebanho estava cada vez mais diminuindo, porém sem qualquer motivo justificável. Como era muito inteligente, resolveu marcar seu rebanho para descobrir o que estava acontecendo. Seguiu as pegadas que deixaram, levando-o até seu vizinho, um Autólito (uma criatura capaz de se transformar em qualquer animal e o estava fazendo para roubar o rebanho de Sísifo). Nesse mesmo momento, Zeus estava enfurecido com Sísifo por outro motivo. Como todo o mito grego, uma história sempre tem influência na outra. Zeus havia raptado a filha de Asopo (deus rio) e na tentativa de resgatá-la, percorrendo diferentes lugares, teve um encontro com Sísifo, que sabia quem havia raptado sua filha. Porém, por ser inteligente, pediu uma fonte de água em troca da informação. Asopo foi atrás de Zeus, que conseguiu escapar de sua fúria, mas que não pôde deixar de se vingar de Sísifo. Por isso, ordenou a Hades (deus do submundo), que levasse sua alma.

Como se não fosse suficiente, Sísifo pediu para sua esposa não enterrá-lo. Ao chegar no submundo, pediu a Perséfone (esposa de Hades) para voltar à vida para organizar seu sepultamento porque ninguém o havia feito. Ela permitiu que ele fosse apenas por 3 dias, mas ele não voltou. Como nenhum deus aceita ser traído e para ser punido por tentar driblar a morte e o submundo, Sísifo teria que passar o resto da eternidade rolando uma pedra até o topo de uma montanha. Porém, ao chegar próximo ao topo, o cansaço e o peso fariam com que a pedra rolasse novamente montanha abaixo, sendo necessário recomeçar sempre a mesma tarefa, em um ciclo sem fim.

E enfim, o que isso teria a ver com você? As vezes pode parecer que é só uma história contada e que não tem sentido nenhum, então peço que apenas leia com o coração aberto. Muitas vezes, essa tarefa repetitiva nem precisa ser de fato o trabalho que acordamos e precisamos fazer todos os dias, podemos também falar sobre nossos padrões e dificuldades com a mudança. Claro que no mito, este foi um castigo que Sísifo recebeu. Mas se pensarmos, o castigo foi por ter driblado o submundo. Dentro de um significado religioso (cristão), esse lugar é realmente onde vamos para pagar pelos nossos pecados. Mas e se eu te convidar e olhar para isso com uma perspectiva diferente? Esse lugar não é conhecido, é assustador, é o lugar dos nossos erros, mas não o lugar de aprender, apenas se punir. É de onde queremos manter distância e nossa “sanidade”. E se eu te disser que é esse o lugar onde você pode mais aprender sobre si? Normalmente, na vida, fazemos como Sísifo e tentamos escapar dos nossos infernos interiores, ocupando-nos com uma vida que se resume a repetir tarefas sem profundidade e sentido. Aguentar esse inferno e olhar para o que tem lá é assustador e existe uma busca, inclusive coletiva, de evitar essa reflexão.

Existe, inclusive, um ditado popular que você provavelmente até já deve ter falado: “Cabeça vazia, oficina do diabo”. Mas e se esse inferno e esse diabo na verdade forem os seus próprios medos que você tanto evita? E se na verdade só estamos todos os dias levando a pedra até o topo da montanha e reclamando o tempo todo ao fazer isso, mesmo sendo muito ruim e desgastante, porque temos essa dificuldade de entrar no nosso inferno?

E é por isso que eu te pergunto: O que é o seu inferno? Do que você tem tanto receio? E mais: vale a pena viver a vida empurrando uma pedra porque você tem medo de olhar pra dentro? Vale a pena se esgotar na produtividade só para fugir de coisas que você nem entende?

Essas são reflexões fundamentais de serem feitas pessoalmente, ai no seu interior e com o maior acolhimento possível que você conseguir se dar. Não é fácil, sei que não, mas é por isso mesmo que eu estou aqui te fazendo essas perguntas. O processo de olhar para dentro é mais fácil quando alguém consegue nos mostrar alguns caminhos e encorajando para os próximos passos. E muito do processo de terapia é isso também: olhar para a sua profundidade com acolhimento e ir descobrindo a cada passo como é esse lugar desconhecido. Uma escuta qualificada pode te ajudar nesse aprofundamento. Por isso, agende sua sessão de terapia para ter essa mudança tão necessária e entrar em contato com o de mais rico em você. Você já chegou até aqui, é possível. Porque uma coisa eu te garanto: viver a vida empurrando uma pedra não me parece uma escolha com sentido, ainda mais quando é para fugir do que se tem dentro de si. A terapia que você merece pode acontecer agora mesmo.

Por Amanda Abade

Psicóloga, Terapeuta Junguiana e Arteterapeuta

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